Há 79 anos, no dia 22 de agosto de 1942, o Brasil reconhecia estar em estado de beligerância contra a Alemanha e a Itália[1]. Isto é, entrou em guerra contra esses dois países porque foi atacado por eles!

Com efeito, iniciada a guerra na Europa, em 1939, a Alemanha e a Itália começaram a atacar os países que auxiliavam de qualquer jeito as nações contra as quais combatiam. E o Brasil por dar suporte às operações norte-americanas em território nacional[2], virou alvo.

E o que fizeram esses países contra o Brasil para ele entrar em guerra? Enviaram submarinos para afundar navios de passageiros e de carga, brasileiros, em qualquer lugar do mundo. Tendo a maioria dos afundamentos ocorridos nas costas brasileiras.

Tais embarcações navegavam desarmadas, levando crianças, mulheres e homens. Quase todos eles civis[3]! E nessa trágica situação, 972 brasileiros inocentes morreram, entre 1941 e 1943[4]. O mês de gosto de 1942 foi o pior período, quando mais de 600 delas se afogaram presas dentro dos navios em que viajavam, sem meios de se salvarem[5]. A imagem nos jornais dos corpos mortos espalhados pelas praias dia a dia, chocou a nação! Alguns desses corpos, dilacerados pelos tubarões.

Assim, a população brasileira saiu às ruas e exigiu uma resposta enérgica do governo em face a esses ataques covardes. Muitas medidas foram tomadas e dentre elas, duas de cunho militar: uma interna, redistribuindo as forças militares pelo território nacional, enfatizando a defesa do litoral. E outra externa, com a criação da Força Expedicionária Brasileira, a FEB[6]. Uma tropa de combate de cerca de 25.000 homens, foi enviada para lutar no Teatro de Operações da Itália.

Para a formação da FEB praticamente todos os Estados do Brasil contribuíram com a sua  composição: 91, do Amazonas; 281, do Pará; 679, do Mato Grosso; 126, do Maranhão; 67, do Piauí; 377, do Ceará; 341, do Rio Grande do Norte; 349, da Paraíba; 651, de Pernambuco; 148, de Alagoas; 192, de Sergipe; 686, da Bahia; 111, 

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de Goiás; 2947, de Minas Gerais; 3889, de São Paulo; 345, do Espírito Santo; 1542, do Paraná; 956, de Santa Catarina; 1880, do Rio Grande do Sul e 7586, do Rio de Janeiro[7]. Dentre seus componentes havia, além do pessoal que combateria nas linhas de frente, também outros profissionais que atuariam mais na retaguarda, como médicos, enfermeiras e 27 padres, do Serviço de Assistência Religiosa (hoje, SAREx)[8].

Mas formar a FEB não foi uma tarefa fácil. O Brasil, até então, usava armamentos e táticas adaptadas da escola francesa, cuja Missão Militar havia sido contratada nos anos 20 e durou até 1940. E para se lutar na Itália, usar-se-iam meios norte-americanos. Além disso, a mobilização envolvia uma seleção de convocados e voluntários, que passaram por uma avaliação médico-dentária muito dura, no início, para os padrões de então da realidade brasileira, que eliminou muitos deles[9]. E todas essas atividades deveriam ser executadas sob sigilo absoluto, para evitar suspeitas (por conta do trânsito de tanta gente e meios), pois havia espiões inimigos espalhados pelo Brasil.

Isso fez com que a maioria dos reveses só fossem superados em meados de 1944, quando, enfim, a FEB partiu para a Europa. E chegou num momento decisivo! A Alemanha contava já alguns reveses nas suas campanhas militares e um golpe duro havia acabado de lhe acontecer: a invasão da Normandia.

Para esse plano dar certo, as tropas experientes dos Aliados (o conjunto de países que se uniram para combater os países do Eixo, liderados pela Alemanha[10]) que lutavam na Itália, teriam de ser enviadas para a França. E para evitar que as tropas alemãs retornassem para a Alemanha e reforçassem as defesas de seu país, havia a necessidade de dar combate a elas na Itália, de forma que se rendessem ali. E o Brasil entrou na guerra para este tipo de missão: derrotar e deter os alemães em solo italiano.

Uma enorme tarefa! A ponto de haver uma piada que corria na época de que era mais fácil uma cobra fumar do que o Brasil trazer a vitória! Mas a cobra fumou! As vitórias de Monte Castelo, Montese e a rendição da 148ª Divisão Alemã, que possuía mais de 15.000 homens, por exemplo, são prova disso!

A FEB teve de superar não só desafios militares, durante a campanha, mas também climáticos e políticos. Desembarcando no Velho Continente no verão, deparou-se com a falta de fardamento adequado, que com a chegada do inverno, logo teve de ser suprido[11]; teve de adaptar-se a seus novos armamentos e táticas (norte-americanas)[12]; ambientar-se à guerra, que logo trouxe mortos, mutilados, feridos e muita destruição à realidade do pracinha[13] brasileiro; lidar com certos reveses, pelos quais todos os países beligerantes passaram, mas para alguns militares brasileiros foram encarados como a maior vergonha da história do exército nacional[14]; além de jogos de interesse no Brasil, e em solo italiano, que prejudicavam a manutenção da tropa em luta e até influenciaram na decisão brasileira de não permanecer na Europa, depois da guerra, como tropa de ocupação e de garantia da lei e da ordem, na Áustria[15].

É de se destacar, como se viu, que a Força Expedicionária Brasileira não era constituída de super-homens. Ao contrário. Para a FEB, quanto mais humano fosse seu soldado, com seus erros e defeitos, lutando para aflorar em si valores e virtudes, diante dos obstáculos e adversidades, maior ele era. E isso fez e trouxe a vitória!

No remate, viu-se que a FEB cumpriu sua missão! Deteve o avanço alemão na área que lhe competia, mesmo lutando com uma só Divisão[16], enquanto os EUA lutavam com 69, na Itália.

Sem sombra de dúvidas, a cobra fumou!

[1] Posição ratificada pelo Decreto-Lei 10.358, de 31 de agosto de1942.

[2] Os Estados Unidos da América estavam em guerra contra o Japão, a Alemanha e a Itália, desde o ataque japonês contra sua base naval, no Havaí, em 7 de dezembro de 1941. Com a guerra em curso, enviou tropas para lutarem no norte da África, contra tropas alemãs e italianas, dando suporte aos britânicos. Por conta da autonomia das aeronaves de então, usavam uma Base Aérea em Natal – chamada Trampolim da Vitória – como escala dos aviões que partiam dali rumo ao continente negro. É de se registrar que o Brasil rompeu relações diplomáticas com o Japão, em razão do mesmo ataque e, em junho de 1945, declarou guerra contra o Japão, por meio do Decreto 18.811, de 6/6/1945, encerram suas atividades bélicas na Europa.

[3] A lista de todos os navios afundados e quais submarinos os afundaram, pode ser encontrada aqui: https://www.acritica.net/mais/opiniao-dos-leitores/onde-estao-nossos-pracinhas/145607/

[4] Alguns autores defendem que foram 1081 brasileiros que morreram nesses afundamentos, como Roberto Sander, em O Brasil na mira de Hitler, que cita a história de 34 desses afundamentos. Nos campos da Itália morreram 457 militares.

[5] O submarino alemão U-507 afundou 6 navios de passageiros, em agosto de 42. Seu comandante usava uma tática desumana de lançar dois torpedos, em sequência, contra seus alvos, o que fazia com que os navios afundassem rapidamente, não dando tempo de os passageiros saírem dos navios! Nessa série de 6 afundamentos, 607 pessoas morreram. Apud Arantes, Marcus Vinicius de Lima. Torpedo. O terror no Atlântico. Livre Expressão Editora: Rio de Janeiro, 2012, p. 43.

[6] Criada pela Portaria Ministerial 4744, de 9 de agosto de 1943.

[7] Composição da FEB. Revista Verde-Oliva. Maio de 1985. Centro de Comunicação Social do Exército, Brasília, 1985, p. 4.

[8] A Canção do Serviço Religioso do Exército teve a letra composta pelo Coronel Capelão Euclides José da Silva e pelo Tenente Capelão Cláudio J. Kirst. A música foi composta pelo Capitão Músico Benigno Parreira, tio do autor deste artigo.

[9] A enfermeira, Major Elza, que foi membro da FEB, relata que no início da campanha de convocação houve até quem quisesse que se escolhesse “qualquer coisa”, doentes inclusive, pois eles seriam bucha de canhão e para isso “qualquer coisa serve”! CANSANÇÃO, Elza. E foi assim que a cobra fumou. 3ª Edição. Imago Editora: Rio de Janeiro, 1987, p. 54.

[10] A lista de países do Eixo e os Aliados: https://en.wikipedia.org/wiki/Axis_powers

[11] Naquele ano, 1944, o inverno chegou a temperaturas de -20ºC.

[12] A FEB foi incorporada a uma unidade militar dos Estados Unidos da América. Era parte do IV Corpo do V Exército norte-americano.

[13] Alcunha pela qual os soldados do Brasil que lutaram na Itália ficaram conhecidos no Brasil.

[14] Os avanços para a tomada de Monte Castelo tiveram 4 ataques infrutíferos, para na quinta tentativa, em 21 de fevereiro de 1945, conseguirem tomar a posição aos alemães.

[15] Os EUA queriam que Brasil participasse da ocupação. https://www.dw.com/pt-br/eua-queriam-que-brasil-participasse-da-ocupa%C3%A7%C3%A3o/a-18421978

[16] Mais sobre o que significa uma Divisão: https://pt.wikipedia.org/wiki/Divis%C3%A3o_(militar)

One thought on “O Brasil na Segunda Guerra Mundial: a criação da FEB

  1. Angelica Prado de Souza disse:

    Que gostoso que é ler um conteúdo confiável da historia do nosso pais, obrigada ICD, vcs são uma benção para nossas familias ♥

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